sábado, 15 de fevereiro de 2014

Anselmo Borges: "O Papa e o maldito sexo. 2"

Texto de Anselmo Borges no DN de hoje (daqui):

Num gesto sem precedentes, o Papa Francisco enviou aos católicos de todo o mundo um inquérito com 39 perguntas, para saber directamente e não já só pelos bispos o que se passa em domínios considerados tabu: novas formas de família, casais homossexuais, uniões de facto, relações pré-matrimoniais, divorciados que voltam a casar e a sua relação com os sacramentos, adopção, contracepção, uniões à experiência, educação religiosa das crianças...

Os resultados, que ajudarão na preparação para a Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos sobre "Os desafios pastorais sobre a família no contexto da evangelização", em Outubro próximo, ainda não são totalmente conhecidos, mas nomeadamente as Conferências Episcopais da Alemanha e da Suíça já publicaram os referentes aos seus países. Em ambos os casos, bem como num inquérito realizado pela Bendixen & Amandi para a cadeia de televisão norte-americana Univisión a católicos dos cinco continentes, conclui-se que a maioria dos católicos não está de acordo com a doutrina oficial da Igreja.

Concretamente nos relatórios alemão e suíço, pode ler-se a valorização do casamento católico. Textualmente, no alemão: "A ideia do casamento enquanto sacramento, que implica a fidelidade e a exclusividade do cônjuge bem como a transmissão da vida, é normalmente aceite por quem se casa na Igreja." Mas logo a seguir: "Pelo contrário, as afirmações da Igreja sobre as relações sexuais pré-matrimoniais, a homossexualidade, os divorciados recasados e o controlo da natalidade são aceites por pouquíssimos ou prevalentemente rejeitadas de forma explícita."

Não se deverá esperar um simples aval do Papa e do Sínodo ao resultado do inquérito mundial. Marcello Semeraro, secretário do G8 cardinalício que aconselha o Papa, já preveniu contra a ideia de ver as maiorias aprovadas: "O papel do Papa e dos bispos não consiste em serem notários de uma maioria." Mas é igualmente claro que algo tem de ser feito.

Como escreveu Miguel Oliveira da Silva, deve perguntar-se se, no universo sexual, que continua a ser "um imenso, incómodo e multifacetado mistério", vale tudo. É claro que não, e reconhece que "a sociedade ocidental vive um profundo e grave vazio ético em matéria de sexualidade, que a múltipla oferta de uma sexualidade por vezes devassada sem pudor na praça pública e passível de excessos não consegue minimamente preencher - ao contrário".

De qualquer modo, a Igreja precisa de reconciliar-se com o mundo e a ciência, o corpo e a sexualidade. E lá está, por exemplo, o famoso número 14 da encíclica Humanae Vitae contra a contracepção artificial. Neste domínio, o equívoco fundamental da encíclica encontra-se numa concepção de lei natural fixa, estática e centrada na biologia. Ora, por natureza o ser humano é cultural e histórico e a própria realidade é processual. A sexualidade humana não pode ser vista apenas na sua vertente biológica, pois envolve o biológico, o afectivo, a ternura, o amor, o espiritual, e é preciso superar o dualismo de fim primário (procriativo) e fim secundário (unitivo) e a argumentação moral centrada nos actos isolados. Por outro lado, não é o homem interventivo e transformador da natureza? E ainda serão naturais os métodos que têm que ver com uma descoberta e aproveitamento humanos dos períodos inférteis da mulher?

Como pedia o cardeal Carlo Martini, "é um sinal de grandeza e autoconsciência alguém confessar os seus erros e visão limitada". Assim, "o Papa talvez não retire a encíclica, mas pode escrever uma nova e ir mais longe. É legítimo o desejo de que o Magistério diga algo de positivo sobre o tema da sexualidade". "Procuramos um caminho para, de modo fiável, falar sobre o casamento, o controlo da natalidade, a procriação medicamente assistida, a homossexualidade, a contracepção."

Mas, aqui, impõe-se uma outra pergunta: enquanto se mantiver a lei do celibato obrigatório, que Martini também interrogava, não estará todo o discurso eclesiástico sobre o tema debaixo do fogo da suspeita?

9 comentários:

Anónimo disse...

Prontos, o autor mostrou o que lhe vai na alma, ajudar a que se consiga levantar a voz da turba contra os ensinamentos sobre sexualidade da Igreja. Para depois conseguir acabar com aquela coisa incomoda do celibato. Probreza obrigatoria nunca. Depois acabar com o celibato. E ja se ve que obediencia, vou ali e ja volto. Deus nos salve destes "pastores", cheios de si proprios, de riquezas e prazeres. Ha 5o anos abriram-se janelas... agora atiram o crucificado por elas: "Esta casa não é tua Senhor, é nossa, da turba maioria."

Euro2cent disse...

> De qualquer modo, a Igreja precisa de reconciliar-se com o mundo e a ciência, o corpo e a sexualidade.

Paleio tolo de jacobino.

As aleivosias sobre "o mundo e a ciência" será carapuça que podem enfiar aos pregadores semi-analfabetos protestantes, não à Igreja Católica das universidades, cientistas e pedagogos.

E a Igreja não precisa de "reconciliar-se" porra nenhuma com os desvarios da moda sobre "corpo e sexualidade". Até os imbecis da imprensa geral já publicam artigos sobre a correlação entre "delayed gratification" e sucesso na vida.

Anónimo disse...

Julgo ser claro que a igreja deve rever algumas das suas posições e, concordo quando se diz que esta se deve reconciliar com a sexualidade. A sexualidade é uma das necessidades humanas básicas, Deus fez-nos seres sexuados como tal negar a sexualidade é dizer que o pai nos fez “mal feitos”, agora, como com tudo na vida, esta deve ser vivida de forma responsável e regrada. É possível viver sem uma sexualidade activa, tal tarefa é contudo difícil coroando com mérito quem o consegue fazer! Muitos/as o conseguem, pois estão naturalmente vocacionados para o fazer, mas quem o não consegue, não é menos virtuoso, não faz é parte da sua natureza!

A igreja deve alertar para o uso de uma sexualidade saudável, a sexualidade é algo sagrado, é a união física de duas criaturas que se amam, como tal não deve ser banalizada como se de comer ou beber se tratasse, é para ser vivida quando se tem a certeza que há amor! O que a igreja deve condenar (segundo o meu ponto de vista) é a promiscuidade, a banalização do sexo e do corpo, não a sexualidade. O sexo não é pecaminoso, o mau uso do mesmo é que o é! Ademais o sexo não deve ser reduzido à sua função reprodutora, tal seria reduzir o homem à animalidade!

Deus fez-nos para ser felizes, como tal devemos encetar todos os esforços possíveis para alcançar a felicidade. Temos pistas para o conseguir, e sabemos que esta no ser e não no ter. Para uns o casamento é uma via para a felicidade, no entanto este por variados motivos nem sempre é feliz. Se Após esforços sinceros e verdadeiros não se conseguir a harmonia no casal julgo não haver mal em pedir o divórcio; contudo quando se parte para o casamento deve ser com o desejo que seja para a vida, não com pensamento de que se não resultar… penso que educar para um matrimónio responsável é um dever da família que deve ser assessorada pela igreja.

Quanto á contracepção, temos de ter em atenção 2 variáveis; a 1ª é se o método é abortivo, neste caso deve ser veemente condenada; na 2ª não sendo abortivo deve ficar á consideração do casal, que deve analisar o seu plano de família e ajuizar se este está de acordo com o “desejo” de Deus e seguidamente agir em conformidade.

Em resumo penso que a Igreja deve rever algumas das suas normas, nomeadamente quanto ao celibato dos padres, tal como na igreja católica de rito oriental o celibato deveria ser opcional. Rever algumas das posições quanto á contracepção, e também quanto á orientação sexual, o homossexual não o é por opção, faz parte da sua natureza, assim foi criado como tal, o que deve ser condenado não é a sua orientação mas sim o mau uso que possa fazer da mesma.

Posto isto depreendo que muitas serão as vozes em desacordo, no entanto digam o que disserem não irei defender ou acrescentar algo mais a esta minha posição.

José Pinto

Anónimo disse...

Este texto de Anselmo Borges vem mesmo em boa altura sobretudo para 8:55 da tarde que me parece viver num circulo redutor e reducionista e não só pois ainda há muito boa gente que prefere manter como fio condutor da sua visão moral aquilo que a “velha” Igreja ainda teima em defender mesmo sabendo que é completamente obsoleta a indefensável nos dias de hoje manter uma teologia antiquada e uma antropologia dualista e machista em face da sexualidade e do corpo!

Mas a questão do “alvoroço” está muito mais armadilhada porque nos bastidores desta temática escondem-se medos profundos sobre a revolução cultural que carrega tal mudança sobretudo porque vai gerar a emancipação e autonomia da mulher e sobretudo a distinção clara separando o que são apenas relações sexuais normais em vista dos fins da união de um casal e os objectivos claros com a questão da procriação!

Valha-nos que o tema não é uma questão de Fé e embora a hierarquia possa “recomendar” por via de documentos ninguém se coloca fora da comunhão porque discorda! Graças a Deus para bem da Igreja que dentro dela sobretudo nos teólogos e outras áreas existam mais de metade dentro da Igreja como voz discordante! Não será por acaso que foi escolhido este timing para o tal questionário pedido pelo papa Francisco realmente a coisa está a mexer e a fazer estrebuchar velhos alicerces da teologia moral e irmãs! Eu até percebo claramente a irritação neste espaço quando se toca neste tema mas bem pode o peixe espernear que a rede do Renovo da Igreja já não pára a pesca! Agora é preciso coragem e sem hesitar toca a separar o peixe comestível do não-comestível coisa que dá muito trabalho muita luta e é duro! Nota-se!

Anónimo disse...

Volto só para relembrar algumas memórias vagamente desejosas de esquecer aquilo que tanto as inquieta!

"Temos de encontrar um novo equilíbrio, se não o edifício moral da Igreja pode cair como um palácio de cartas”, disse Francisco.

Anónimo disse...

O Anselmo que leia e pronto. Não há abertura do Papa Francisco para questões sobre os sacramentos para os divorciados recasados, nem sobre a contracepção, homossexualidade e aborto. Cardeal Sean O'Malley - em entrevista publicada ontem pelo Boston Globe e reproduzida pelo Vatican Insider - era bem claro: Francisco apenas suaviza o tom, quem espera que seja revisto o posicionamento da Igreja, vai se decepcionar.

O arcebispo capuchinho de Boston é um dos cardeais mais próximos de Bergoglio, mesmo antes de sua eleição à Cátedra de Pedro, por ter viajado muitas vezes para a América Latina. O Papa o incluiu entre os oito consultores do "C8", a comissão de cardeais nomeados pelo Papa para colaborar com o governo da Igreja e a reforma da Cúria, que nos próximos dias realizará sua terceira reunião.

"A Igreja deve ser fiel ao Evangelho e aos ensinamentos de Cristo", disse O'Malley na entrevista, acrescentando: "Às vezes é muito difícil. Devemos seguir o que Cristo quer e confiar que, o que Ele pede é a melhor coisa". Em relação aos sacramentos para divorciados recasados ​​que gostariam de estar mais próximos à Igreja, o cardeal se limita a dizer "não vejo nenhuma razão" para afrouxar as regras.

Algumas mudanças, no entanto, não faltarão: "é possível", disse o cardeal, que o Papa Francisco nomeie uma mulher para dirigir algum Dicastério do Vaticano, tipo, hipoteticamente, o Pontifício Conselho para os Leigos. E, além disso, acrescentou, o Papa está incentivando um sistema “mais fácil" para nulidade, tal como permitir que as solicitações sejam resolvidas a nível nacional, sem ter que chegar tudo a Roma.

Anónimo disse...

Anselmo Borges ao seviço do mundo. Pergunto: para o quê a Igreja? Para o quê Deus? Para o quê Jesus? Porque não um Jesus ideologo - mais um - e um cristianismo como uma ideologia? estes padres q dominam o espaço mediatico têm uma agenda clara e desconfio q uma coisa em comum: Deus é um pormenor e muitas vezes um impecilho. Siga a banda.
Jacome

Anónimo disse...

A maioria do clero da Igreja Americana é reaccionário integrista e misógino e O'Malley foi por sinal um grande defensor da Missa Tridentina embora tenha virado a casaca e até pedido a uma ministra metodista que lhe arranja-se um ritual para reafirmar o seu baptismo deixando-se benzer por esta na fronte:

http://www.sinaisdoreino.com.br/?cat=9&id=1164

Eles até gostam muito de dar shows de humildade trajando o hábito franciscano mas há muito que já estamos falados com o exemplo de uma figura Francisca cá da nossa praça! Muita pobreza Francisca mas depois logo se vê pelo testemunho e reformas douradas! Esta figura dos usa não me inspira confiança nenhuma toda a gente esperava que fosse ele o eleito Papa mas Deus lá saberá porque escolheu Francisco e não tal personagem! Lefebristas convertidos ná é fogo que não me aquece!

Anónimo disse...

..É intrigante verificar q numa época caracterizada pela exposiçâo e venda do corpo da mulher e cada vez mais tb do corpo do homem. Caracterizada pela pornografia institucionalizada e pelos efeitos nefastos na juventude em que a adicção pelo sexo chega a ser uma nova doença de efeitos ruinosos na vida de multidoes. Numa epoca q quer banalizar o sexo desde a mais tenra e inocente infancia. Caracterizada pela exploraçao do sexo como produto de marketing. No fundo uma epoca q animalizou o sexo e q o transformou num produto de consumo em q até a morte de inocentes é apontada como soluçao para as gravidezes indesejadas. Nesta época em q as propostas do 'mundo' sobre o sexo mais não são do q o prazer pelo prazer no seu sentido mais egocentrico (e por isso destruidor)nesta época em que a Igreja guarda este tesouro e apresenta o sexo, apesar das dificuldades q este tema tão complexo apresenta, de uma forma responsável e com uma bitola bem elevada por vezes dificil de alcançar, o q propoe Anselmo Borges? Antes demais segue o coro do mundo q continua a dizer q a Igreja está desactualizada e retrogada e nao se vê uma palavra acerca das verdadeiras questoes q o deveriam preocupar. Qual é o plano de ABorges? qual é a sua agenda sibilina? tenho a certeza que esta a preparar o terreno para amaldiçoar Francisco num futuro breve tal como a restante turba mundana qunando for evidente (como já é e sempre foi) q ele Francisco nao é nenhum instrumento do mal. Isto prova tão só q no fundo Anselmo Borges a boleia do seu titulo de sacerdote anda a pregar tudo menos a palavra de Deus e tem graves responsabilidades, antes largasse o hábito e se assumisse. Gostaria de estar enganado e verificar q ABorges é tao só um homem desenganado e vazio de fé e esperança mas bem intencionado - como admito q existam muitos homens nestas circunstancias - mas receio bem q nao
Jacome

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